Panteísmo

Ao Boto de Carvalho.

Tarde de brasa a arder, sol de verão
Cingindo, voluptuoso, o horizonte...
Sinto-me luz e côr, ritmo e clarão

Dum verso triunfal de Anacreonte!

Vejo-me asa no ar, erva no chão,
Oiço-me gota de água a rir, na fonte,
E a curva altiva e dura do Marão
É o meu corpo transformado em monte!

E de bruços na terra penso e cismo
Que, neste meu ardente panteísmo,
Nos meus sentidos postos e absortos,

Nas coisas luminosas dêste mundo,
A minha Alma é o túmulo profundo
Onde dormem, sorrindo, os deuses mortos!




Sonetos
Florbela Espanca



Fotografía de © Sam Rock

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