Letras Galegas 2016



Cavalinho-do-demo

Cavalinho-do-demo:
pinga de luz
cristalizada
em lene sonho,
rumor do siléncio,
calada semente
de páxaro,
assombro do azul
mais delicado,
pura nostalgia,
irreprimível
salouco do orvalho.

Claro regueirto, alto de músicas,
de apaixonados assobios mágicos,
medram-che as árvores como anseios,
vigiam o teu tremor as espadanas:
naçom, ti só, única pátria
dos cavalinhos-do-demo que te voam
coa sua graça subtil e delicada:
tal fechar as fatigadas pálpebras.

Cavalinho-do-demo: ninfa
que foche caravel
em jardins subaquáticos.
estremecendo
a virginidades
da água saloucante.
Pétalo que vás
sobre as ondas:
navegante solitário
cara ás ilhas
incertas da lembrança.

O teu voo, ouh cavalinho-do-demo!
nom é morte em linha recta
como o voo assassino dumha bala,
nom tém o forte impulso
da seta disparada polo arco:
ti caminhas seguro polo ar dando
voltas, revoltas, viravoltas.
Sabes que a recta nom é rota
que nos poda levar
á tribo da fantasia sem retorno.

Mágica, irisada transparéncia
assombrando e agarimando
ao ar que te tem e te sustém.
Pinga de luz na luz,
mínimo latejo incendiando
de nédio amor ao universo.
Non te reflecte o rio: és ti
quem espelha, nos teus
lúcidos olhos alertados,
a transparéncia da água
que passa enviso e fugidia
arquivando-te
no espelho fiel da sua memoria.

Nunca tés acougo.
Afirmas-te na vida
e habitas na água,
no junco,
na folha
e na espadana.
És case irreal.
E nom sei se vés
da nada
ou ao infindo vás.

Intenso relampo súbito e fugaz,
lôstrego feridor
que rebenta como um germe
bêbedo de azul e claridade
perdendo-se no serao
da nossa senlheira melancolia
atormentada.
Cavalinho-do-demo:
decoras, ilustras e iluminas
os meus olhos cansos e feridos.
Logo foges. Pero deixas-me
o teu fondo ronsel
de breves lonjanias impossíveis.

Que semelhança tenhem as tuas asas,
cavalinho-do-demo,
coas asas dum anjo
ou coas invisíveis asas de Cupido?
Sei que as tuas asas som
mármore, neve e tremeleante
orvalho nu e trascendido.
As tuas asas, despidas de matéria,
feitas estám
com sementes de sonhos e alvoradas.

Ti, cavalinho-do-demo, és pureza,
gratuidade generosa,
graciosa beleza necessária,
independente flor imarcescível
sempre aberta
contra ao desamparto e a morte.
Que mornura terám os teus
anseios? Que música lateja
no teu mínimo coraçom senlheiro
e ceive? Que primavera
incendia apaixonada o sangue teu?
E que sol-pores outoniços
che amarelecem
as tuas levíssimas nostalgias...?

Sinto a tua lonjana soidade como
o recendo dumha palavra amada
ou a nota mágica dum romántico,
delirante violino que escoa
pálidos mistérios saloucantes.
Nom hai nada nem ninguém
que poda assumir a auséncia tua,
desconsolado oco, borborinho
de azul que me acuitela e fere
cum sonm de campana atormentada.
Pero tenho a certeza de que ti,
cavalinho-do-demo, amigo meu,
nunca chegarás a ser cavalo.


Oraculos para cavalinhos-do-demo (1986)
Manuel María


Ilustración de Carlos Quesada

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