RUMOR DE FOLHAS LÍQUIDAS


Imitação da água

De flanco sobre o lençol,
Paisagem já tão marinha,
a urna onda deitada,
na praia, te parecias.

Urna onda que parava
ou melhor: que se continha;
que contivesse um momento
seu rumor de folhas líquidas.

Urna onda que parava
naquela hora precisa
em que a pálpebra da onda
cai sobre a própria pupila.

Urna onda que parara
ao dobrar-se, interrompida,
que imóvel se interrompesse
no alto de sua crista

e se fizesse montanha
(por horizontal e fixa),
mas que ao se fazer montanha
continuasse água ainda.

Uma onda que guardasse
na praia cama, finita,
a natureza sem fim
do mar de que participa,

e em sua imobilidade,
que precária se adivinha,
o dom de se derramar
que as águas faz femininas

mais o clima de águas fundas,
a intimidade sombria
e certo abraçar completo
que dos líquidos copias.




Imitation of water

On the sheet, on your side,
already so marine a scene,
you were looking like a wave
lying down on the beach.

A wave that was stopping
or better: that was refraining;
that would contain a moment
its murmur of liquid leaves.

A wave that was stopping
at that precise hour
when the eyelid of the wave
drops over its own pupil.

A wave that was stopping
in breaking, interrupted,
would stop itself, immobile,
at the height of its crest

and would make itself a mountain
(being horizontal and fixed)
but in becoming a mountain
would yet continue to be water.

A wave that would keep,
in a seashore bed, finite,
the nature without end
that it shares with the sea,

and in its immobility,
guessed to be precarious,
the gift of overflowing
that makes the waters feminine,

and the climate of deep waters,
that shadowy intimacy,
and a certain full embrace
you copy from the liquids.


Imitación del agua

De flanco sobre la sábana,
paisaje ya tan marino,  
a una ola acostada, 
en la playa, parecías.      

Una ola que se paraba
o mejor: se contenía;
que sostuviese un momento
su rumor de hojas líquidas.                                  

Una ola que se paraba 
en aquella hora precisa 
en que el párpado de la ola
cae sobre la otra pupila.                                    

Una ola que se estancara 
al doblarse, interrumpida,
que inmóvil se interrumpiese 
en el alto de su cresta                                      

y se hiciese montaña 
(por horizontal y fija) 
mas que al hacerse montaña 
fuese de agua todavía.                                

Una ola que guardase 
en la playa cama, finita, 
el modo de ser sin fin 
del mar de que participa,                                

y en su inmovilidad, 
que precaria se adivina; 
el don de verterse que hace 
a las olas femeninas,                          

más el clima de aguas hondas, 
y la intimidad sombría 
y cierto abrazar completo  
que a los líquidos copias.        


João Cabral De Melo Neto
(1920-1999)

Fotografías do litoral de Galicia. © Emilio Blanco "Milucho"

Comentarios

Publicacións populares